Boa tarde, fãs de Resident Evil, voltando aqui com a atividade do blog e começando com um assunto que polêmico nas redes sociais, o impacto de Resident Evil ao longo dos anos.
Bom, antes de começar permitam-me falar brevemente de mim e de meu contato com Resident Evil. Eu tenho 37 anos e joguei Resident Evil 1 no PS1 no mesmo ano em que ele foi lançado. Nessa época eu tinha 20 anos e a grande maioria dos fãs de hoje em dia sequer havia nascido. O primeiro contato com o primeiro Resident Evil foi um tanto surpreendente e inovador, isso porque o salto dos jogos de 16 bits (com gráficos 2D) para os 32 bits (com gráficos 3D) causou uma grande mudança nos controles e forma de jogar. Resident Evil foi um dos primeiros jogos em que era preciso mover o personagem pelo cenário e atirar em alvos que não estavam simplesmente à esquerda/direita/acima ou embaixo do personagem que controlávamos. Além disso, embora já existissem puzzles há muito tempo em outros jogos, principalmente em jogos de RPG, em Resident Evil era preciso realizá-los com cuidado porque sempre poderia ter um inimigo por perto pra chatear. Por fim, o ponto marcante e que consagrou o jogo foi a história que deixaria para trás o conceito Mario/Sonic, com seus cenários coloridos e personagens animados e nos trouxe personagens humanos encarando inimigos que pretendiam matá-los da forma mais violenta possível, aquele tipo de roteiro que até então só se via nos filmes de George Romero.
Além da história, bastante ousada para a época, os cenários também davam uma sensação de insegurança, mais uma vez por estarmos acostumados com Mario/Sonic e de repente nos vermos diante de lugares escuros, becos, portas trancadas e inúmeras salas e corredores sem mais ninguém por perto pra pedir ajuda ou mesmo conversar.
E esse foi o grande impacto que Resident Evil causou ao mundo, trazendo elementos inéditos e inovadores em um console doméstico, pra um público infanto-juvenil que não tinha ainda experimentado tais sensações. E nesse momento Resident Evil era o grande atrativo, era o ponto inicial desse impacto e graças à sua própria originalidade, a partir desse momento caminharia para o destino de não ser mais isso tudo, assim como irei explicar a seguir.
Começaria nesse momento o fim do impacto chamado Resident Evil.
Os fãs de Resident Evil ao jogarem o primeiro jogo, nunca se deram conta de quão simples era sua trama. Você tinha em suma dois cenários para investigar, a mansão e o laboratório, no final. Os personagens principais, Chris e Jill, eram pegos de surpresa nos acontecimentos e por sua vez, o jogador também. Cada susto deles era um susto do jogador, que ficava com o coração na mão. Chris e Jill tinham que andar por uma mansão desconhecida, resolver quebra-cabeças e se manterem vivos diante de inimigos que mal conheciam, e o jogador passando pelo mesmo sentimento. Mas… como isso era possível? Por que os sentimentos de Chris e Jill estavam tão claros em quem jogava? Resposta bem simples: porque ninguém havia experimentado ainda um tipo de jogo assim. Resident Evil trazia sustos que deixavam o coração pulando e após os primeiros sustos, os jogadores já ficavam com os batimentos acelerados só de andar por um corredor vazio e ouvindo o som sinistro de fundo e mais nada.
Os tempos mudaram e a geração de videogames também. Em menos de 20 anos, saltamos de uma era de consoles de 32 bits pra uma era com consoles mais poderosos que 256 bits. Nesse meio tempo o estilo que Resident Evil criou, o chamado “survivor horror”, inspirou dezenas de empresas do ramo a criarem jogos similares. O maior rival e maior destaque foi Silent Hill, que usava outro tipo de enredo para causar uma impressão ainda mais realista de medo aos que jogavam. Resident Evil e Silent Hill utilizavam-se do mesmo sistema de jogo, com personagens em 3D que se moviam por cenários estáticos desenhados em 2D com objetos destacados nesses cenários, um sistema comum de jogos indie até os dias de hoje. No entanto, com a evolução do mercado de videogames, um outro sistema tornou-se muito mais popular, o sistema de visão em primeira pessoa, consagrado pela franquia de jogos de guerra Call of Duty. A Capcom, dona dos direitos de Resident Evil, então decide apostar nesse novo sistema (pois com a ascensão desse estilo, se não mudassem perderiam uma legião de novos jogadores que adotavam esse estilo como preferido) e Shinji Mikami decide criar um sistema de primeira pessoa que mantinha o personagem na tela, fazendo com que o jogador o visse o tempo todo e sentisse-se mais próximo do protagonista, vivenciando e sentindo o que ele sentia de perto. A ideia foi utilizada em Resident Evil 4 e tornou-se popular, sendo esse novo sistema o mesmo dos próximos jogos da franquia e de diversas outras franquias de jogos.
Muitos julgam que após Resident Evil 4 e com a introdução desse novo sistema parecido com Call of Duty, Resident Evil tornara-se um jogo de ação e perdera sua essência, seu enredo original e caíra no mercado por não ser mais o que os fãs queriam. Infelizmente essa é uma pequena parte da verdade, mas não toda. Uma reclamação constante é que o jogo tornara-se fácil com o sistema de visão em primeira pessoa, mas o jogo já era fácil desde Resident Evil 2 Dual Shock, onde era possível usar um cheat adicionado ao próprio jogo (sem gameshark nem nada do tipo, um cheat colocado ali pelos próprios produtores) em que a munição ficava infinita e Leon e Claire simplesmente massacravam os inimigos que encontravam pelo caminho. Em Resident Evil 3 foi implantado o sistema de esquiva que deixou a personagem Jill como uma ninja dos jogos de sobrevivência. Enquanto os novatos alegam que Resident Evil 3 era difícil, os veteranos matavam Nemesis na faca com a Jill e jogando no modo hard, sem nenhum cheat ativado, apenas usando e abusando da esquiva. Já em Resident Evil 4, assim como seus sucessores, o jogo oferece um pequeno desafio para se avançar na primeira vez em que se joga, contudo, após isso, armas poderosas são desbloqueadas para uso dos jogadores. Outro elemento inserido na série em Resident Evil 4 e em todos os seus sucessores foi a possibilidade de evoluir as armas, fazendo com que elas pudessem causar mais dano, carregar mais munição, recarregar mais rápido, ter melhor precisão ao mirar, além de habilidades extras, como uma grande taxa de perfuração, atingindo vários inimigos na mesma linha de fogo com um único tiro (magnuns) ou raio de acerto, acertando vários inimigos paralelos ao mesmo tempo (escopetas).
O fator roteiro/terror também é alvo das críticas, muitos dizem que o roteiro decaiu e o terror sumiu, mas isso não é toda a verdade também. Inicialmente Resident Evil se assemelhava a um filme de terror, mas a ideia que o jogo sugeria não era 100% essa. O próprio nome original da franquia era Bio Hazard (perigo biológico) e esse nome era bem mais cientifico e sugeria bem menos terror que Resident Evil. No entanto, quando Resident Evil chegou aos EUA, o nome Bio Hazard (nome original criado pelos japoneses) já tinha direitos na terrinha do Tio Sam, e a Capcom americana optou pelo nome Resident Evil, que cá entre nós, apenas pelo “Evil” no nome já sugere terror, já é mais apelativo nesse sentido, como em “Evil Dead”. Sendo assim, a franquia seguiu seu curso com a ideia de apresentar armas biológicas, seres mutantes criados em laboratórios usados por terroristas pelo mundo afora. Nesse contexto, o roteiro não decaiu, ele seguiu a linha que propunha desde o início.
Sobre o terror no jogo, mais de um fator indica a queda desse conceito. Primeiramente, no primeiro e segundo/terceiro jogos os personagens eram pegos de surpresa e isso os deixaria assustados e despreparados para o que se seguiria. O jogador teria essa mesma sensação ao ver o que rolava na história, mas esse lance de “surpresa” diante dos inimigos não poderia se manter em mais de 20 jogos e durante mais de 15 anos de desenvolvimento. Seguindo a linha de história do jogo, os protagonistas não ficariam parados vendo a coisa ficar feia, pelo contrário, assim como aconteceu, mesmo sabendo dos perigos, os protagonistas se armaram e foram de encontro com o inimigo, sempre enfrentando-os da melhor forma que conseguiam. Mas não foi isso também o fator principal que tirou o terror do jogo e acabou com aquele impacto inicial que tivemos com nosso primeiro contato com a série.
Quem levou o terror embora foram os próprios jogadores, os próprios fãs, tanto os mais velhos quanto os mais novos, tanto a velha guardo (como eu) quanto a nova geração. Por quê? É isso que eu vou tentar explicar.
Primeiramente, qual jogador de Resident Evil na atualidade nunca jogou outros jogos do chamado estilo “survivor horror”? Eles são tantos que nem dá pra listar todos e embora muitos sejam considerados pelos fã puritanos como jogos de ação, são games de horror e sobrevivência como as franquias Dead Space e F.E.A.R.
Uma vez que um fã já tenha jogado diversos survivors ele vai se “anestesiando” do medo, aquele susto que levávamos inicialmente em Resident Evil 1 e que fazia o coração ficar palpitando mais e mais na expectativa do próximo monstro pelo caminho aos poucos torna-se menor, você começa a levar um susto, mas se recupera mais rápido, é como se, assim como os personagens da história de Resident Evil evoluíram, o jogador também evoluiu.
Além dos novos jogos de survivor, centenas de filmes e livros nos últimos 20 anos fizeram com que os jogadores da atualidade expandissem suas mentes para coisas inacreditáveis. Hoje em dia 90% dos jogadores sequer acredita em fantasmas, monstros, em terror de verdade, a maioria sequer acredita no sobrenatural, mas querem ter esses sentimentos olhando pra uma telinha enquanto jogam, eu diria que é mais fácil de se sentir isso se apagar todas as luzes da casa, deixa apenas um abajur e ler um bom livro de terror na madrugada.
Enfim, jogadores veteranos, aqueles que como eu, jogaram Resident Evil desde o primeiro em seu lançamento raramente se assustariam hoje em dia jogando um jogo em console ou pc, ou mesmo iriam se impressionar ao ponto de ter medo de ir no banheiro ou na cozinha pegar água na geladeira durante a noite. O mesmo vale para a nova geração de adolescentes que nasceram nesse nossa era de humanidade sem terror.
Sendo assim, eu apenas penso o seguinte, se ao invés de criticar e exigirem nas redes sociais por um jogo que lhes faça sentir medo de verdade os fãs passassem a aceitar o jogo como um jogo e a explorar dele o que ele pode oferecer de melhor (não de títulos que não existem, mas dos títulos que temos), encontraríamos coisas positivas para apreciar.
E antes que muitos argumentem, vou lembrar que a última façanha da Capcom, Resident Evil Revelations, não trouxe o survivor horror de volta como muitos esperavam. O jogo conta com uma experiência em que você anda por dezenas de corredores vazios com o som sombrio de fundo, mas quando encontra algum inimigo é um festival de tiros, esquivas e massacre com armas extremamente melhoradas. Talvez Resident Evil Revelations tenha seu lado survivor, mas o lado horror ainda está bem perdido em algum lugar no tempo lá atrás… E as vendas de Resident Evil Revelations foram boas porque a Capcom não almejava um número tão imenso quanto o esperado por Resident Evil 6. Além disso, a nota máxima recebida por Resident Evil Revelations nas revistas especializadas em games foi 7.
E com isso o impacto causado por Resident Evil deixou de ser exclusividade do jogo como era em seu primeiro título, com jogadores desavisados sendo pegos de surpresa para se tornar uma coisa mais ampla, presente em diversos jogos, mas sem o mesmo efeito do começo. Um dia, quando os jogadores voltarem a apreciar um jogo vendo-o apenas como um jogo, Resident Evil voltará a ser o impactante jogo que já foi, mas isso não acontecerá em Resident Evil 7 e com certeza o “survivor horror” não voltará com The Evil Whitin, o novo jogo do criador de Resident Evil, Shinji Mikami nem com nenhum outro jogo recente da nossa geração atual, principalmente pelo fato de que aquilo que já foi um dia chamado de terror hoje em dia não assusta mais os jogadores que já esperam por algo semelhante ou mesmo parecido.
Dan Yukari – Administrador do Blog.